Fome no RN

Por que um terço dos potiguares vive na miséria?

Rio Grande do Norte não foge do contexto nacional e acompanha a evolução. Estima-se, segundo a Secretaria de Estado do Trabalho, da Habitação e da Assistência Social do RN, que  370 mil famílias estejam na extrema pobreza

Francisco Horácio da Silva ao lado de animais que morreram por falta de água e comida, em reportagem da Folha em Senador Elói de Souza  (Allan Lira/Folhapress)

Por William Robson

Não poderíamos esperar outra coisa, senão a acertada sensibilidade da jornalista natalense Renata Moura em descrever o drama de potiguares que estão passando fome no RN.  Que se submetem a comer até lagartos, restos de carne ou disputar com urubus o que dá para não passar a fome. O material, publicado na edição desta terça-feira (7) na Folha de S. Paulo apresenta um cenário onde poucas pessoas verdadeiramente têm noção. E que no RN, mais de um terço dos potiguares está na extrema pobreza.

Dejoem Emanuel explicou na reportagem que só tinha meio quilo de feijão para comer (Allan Lira/Folhapress)

O Brasil já chegou a sair do Mapa da Fome da Organização das Nações Unidas (ONU). O Governo Bolsonaro se encarregou de reinserir o brasileiro neste radar. A alta dos preços, o desemprego e a inflação são o combustível que gesta a miséria. E como o RN sofre com uma vulnerabilidade histórica, sente os efeitos imediatos.

Nas ruas, no semáforo, na entrada dos bancos, dos supermercados e nos bares, a cena se repete: pessoas pedem algum trocado para comer. Estão em todos os lugares, refletindo a distorção social grave que o país vive.  O Rio Grande do Norte não foge a este contexto e acompanha a evolução. Estima-se, segundo a Secretaria de Estado do Trabalho, da Habitação e da Assistência Social do RN, que  370 mil famílias estejam na extrema pobreza, o maior patamar em uma década. Considere uma média de quatro pessoas por família e superamos facilmente a casa do 1,2 milhão de pessoas. O RN abriga 3,5 milhões de habitantes. Ou seja, 38% da população.

De um animal que agonizava de fraqueza, Adailton Oliveira, 52, de Senador Elói de Souza, contou para Renata Moura que ficou com “a mão”, uma das patas dianteiras, pedaço que teve de render por 20 dias no fogão à lenha improvisado. A forma como a jornalista humanizou sua reportagem escancara o sofrimento de um povo.

Muitas destas pessoas que estão sob a triste faixa da miséria são atendidas pelo Bolsa-Família, programa de distribuição de renda que o Governo Bolsonaro fez questão de extinguir com o pretexto de implantar o Auxílio Brasil. Mesmo assim, o recurso não é suficiente diante dos constantes aumentos dos produtos e do gás de cozinha.

Soma-se tudo isso à seca. “Evidentemente a seca agrava o quadro”, ressalta a secretária Iris Oliveira. E não fossem algumas doações, a situação estava ainda pior.  Mas, a questão que pesa, além da fome é a falta de esperança.

A reportagem da Folha  mostra o desalento na figura de Sheila Silva, 37, e do marido, Carlos, na luta por comida. “Passo uma situação difícil”, diz. “Já cheguei a pensar ‘meu Deus, o que vou fazer para janta’, ter só arroz em casa e a enganar meus filhos com qualquer coisa: açúcar com farinha, ou só farinha mesmo.” . Este é o triste retrato de um terço do nosso Estado.