Estratégia placebo

Para a Anvisa, de nada serve o túnel de desinfecção da Prefeitura

Quem afirma isso é a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), que emitiu uma nota no dia 7 de maio, sobre este mecanismo que funciona como uma espécie de borrifação de uma solução à base de quaternário de amônia

Mossoró já parece viver dias normais, como se o coronavírus não existisse ou como se tivesse passado, encontrado sua cura. O Centro da cidade segue lotado, comerciantes da categoria de não-essenciais abrem suas lojas clandestinamente e sabem que tem o aval da Prefeitura para fazê-lo. Afinal, não há fiscalização. Pelo contrário, há até estímulo para que as pessoas deixem suas casas. Entre tantos incentivos, está o afrouxamento de reabertura de setores da economia como de aviamentos e tecidos até o atendimento presencial na Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Turismo. Outro incentivo alardeado na semana passada é uma estratégia meramente placebo: um túnel de desinfecção na entrada da Cobal e que, absurdamente, já está funcionando.

Como sabemos, a Prefeitura de Mossoró já lavou as mãos para o isolamento, até agora a melhor e mais importante medida de prevenção ao Covid-19. Segundo o seu Instagram, “em breve (o túnel) estará em outros pontos onde há grande fluxo de pessoas”. Preste atenção no detalhe: “grande fluxo de pessoas”. Não deveria estar contendo este fluxo e protegendo todos os mossoroenses da pandemia?

A questão maior é que o túnel não tem qualquer eficácia. Quem afirma isso é a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), que emitiu uma nota no dia 7 de maio, sobre este mecanismo que funciona como uma espécie de borrifação de uma solução à base de quaternário de amônia.

A nota técnica 38/2020 versa sobre as estruturas (câmaras, cabines ou túneis) para desinfecção de pessoas e alerta não ser encontradas evidências científicas, até o momento, de que o uso dessas estruturas seja eficaz no combate ao novo coronavírus.

Segundo explica a agência, “o uso dessas estruturas pode produzir importantes efeitos adversos à saúde, já que os produtos químicos supostamente utilizados nesses procedimentos, com exceção do ozônio, foram aprovados pela Anvisa para desinfecção exclusiva de superfícies, não de seres humanos”. Quer dizer, além de não proteger contra o vírus, pessoas com predisposições alérgicas podem sofrer consequências após o banho de produto químico.

Há outras reações ainda: irritação na pele, no nariz, na garganta e no trato respiratório, bronquite, entre outros. Quer dizer, você pode sair pior do que entrou.

A nota também destaca que, “tecnicamente a duração do procedimento, entre 20 e 30 segundos, não seria suficiente para garantir o processo de desinfecção. A Anvisa reforça ainda que esse procedimento não inativa o vírus dentro do corpo humano.”. Em outras palavras: o túnel para nada serve, a não ser causar a falsa impressão nas pessoas de que estão protegidas e livres de qualquer mal. Que enganação, né?

Consultado pelo site, um médico (que preferiu não se identificar) explicou que o produto utilizado pela Prefeitura de Mossoró, o quaternário de amônia, não é irritante para a pele mas não foi feito para ser inalado ou aplicado em mucosa (nos olhos, por exemplo). “Além disso, esses túneis de desinfecção são úteis em laboratório de risco biológico com o profissional devidamente paramentado (roupa impermeável e hermeticamente fechada)”, explicou, alertando que o Comitê de Combate ao Covid-19 da prefeitura não foi informada e nem deu o aval para a instalação das tais geringonças.

Ao que parece, a intenção é estimular as pessoas a saírem de casas, acreditando no milagre mágico de um túnel que não leva a lugar nenhum. Os mossoroenses estão suscetíveis a um contágio em massa ao submeterem-se a experiências deste tipo, que mais prejudica do que atende ao propósito pelo qual foi anunciado. Se outros túneis “mágicos” serão instalados, é certo de que a prefeita Rosalba Ciarlini quer todos seus conterrâneos fora de suas casas, privilegiando a economia, livrando-se da obrigação e induzindo a sociedade ao precipício da doença que já matou mais de 10 mil pessoas no Brasil. E acredite, ficar em casa é mais eficaz do que acreditar em banho de produto químico, óleo da copaíba ou pílula da juventude.