Combate ao coronavírus

O drama da pandemia no RN que o Jornal Nacional não divulgou

Até bem pouco tempo, o Rio Grande do Norte vinha se colocando como exemplo no trato contra a pandemia no Brasil.. Mas, a alta apresentada pelo principal telejornal do país representa novo panorama à borda da fora do controle.

Por William Robson

O noticiário do Jornal Nacional acendeu o alerta. O RN está com a média móvel de casos de Covid-19 em alta. A elevação está em 157%, três vezes mais que a do Estado do Paraná, com que dividia a tela apresentada pelo jornalista Alan Severiano. Para quem vem observando as últimas ações de enfrentamento no combate à pandemia no RN, este aumento não causa surpresa.

Até bem pouco tempo, o Rio Grande do Norte vinha se colocando como exemplo no trato contra a pandemia no Brasil. Sempre bem situado nas estatísticas. A governadora Fátima Bezerra segue incansável na corrida por vacinas, porém sente a pressão do setor econômico que tem colocado tudo a perder. Sim, o empresariado não tem dado paz, mesmo quando o RN está prestes a alcançar seis mil mortos (número há muito alcançado, segundo o professor da UFRN, José Dias do Nascimento, em entrevista ao Foro de Moscow). Além disso, os grupos bolsonaristas, consequentemente negacionistas, promoveram desde sempre manifestações de retomada econômica, quando não se aglomeram para atos antidemocráticos.

A alta apresentada pelo principal telejornal do país representa um panorama à borda da fora do controle. Levantamento do site Saiba Mais desta terça-feira (18) apontou que o RN tem 38 pessoas em estado grave à espera de uma vaga para internação em leito de UTI para pacientes com covid-19. Além disso, dos 26 hospitais com leitos críticos para pacientes com esta doença, 22 estão com 100% de ocupação. Na região de Mossoró, já não havia mais vagas nos hospiais, enquanto mais de 50 pessoas aguardam atendimento.

Por sua vez, quatro regiões do Rio Grande do Norte o quadro de ocupação de leitos críticos (excluindo os bloqueados) está acima de 90% sendo no Estado a média de 93,7%. A região Oeste tem a pior situação com 98,1%.

Por que os números saíram do controle? Para o professor José Dias do Nascimento, o Governo não tem mais ouvido, com a mesma ênfase, o seu Comitê Científico. O grupo tem recomendado decretos rígidos que são relativizados quando editados. O último foi lançado na semana passada, praticamente liberando todos os setores, embora exigindo os protocolos sanitários, comumente desrespeitados.

Bar aproveitou a semana do decreto para promover grande aglomeração em Mossoró

Na semana do novo decreto, editado no dia 12 de maio, um estabelecimento em Mossoró chamou a atenção pela quantidade de pessoas que se aglomeravam em mesas sem o distanciamento recomendado. A repercussão foi tão grande que ganhou as redes sociais dos principais veículos. Ou seja, a consciência passou longe nos proprietários do bar e dos frequentadores do local.

Assim que o decreto “libera geral” foi editado, a Fecomério, que representa os empresários do comércio no RN, comemorou. “Os avanços que o Decreto traz são de grande importância para começarmos a recuperar um segmento do nosso turismo que está enfrentando a maior crise de sua história. A liberação da venda de bebidas alcóolicas e a flexibilização do funcionamento de bares e restaurantes aos domingos são passos muito relevantes”, disse presidente Marcelo Queiroz.  No entanto,  não foram estes avanços que ganharam destaque no Jornal Nacional.

O presidente da Fecomércio, Marcelo Queiroz, que disse que a flexibilização do decreto de Fátima trouxe avanços

A Fecomércio segue a tendência do prefeito de Natal, Álvaro Dias, de abrir em meio à pandemia. Álvaro já deve ter perdido a conta dos decretos editou conflitando com os editados pela governadora. Este último, não.

Nas últimas 24 horas, o Estado registrou 1.173 novos diagnósticos de Covid-19. Desde o início da pandemia, 253.101 pessoas já foram infectadas, segundo números da Secretaria Estadual de Saúde (Sesap), atualizados nesta quarta-feira (19). As mortes caminham com o mesmo ímpeto. Até a noite desta quarta-feira, o boletim da Lais registrava 5.867 mortos. Mesmo assim, a Fecomércio não quer novo decreto rígido. “Os avanços precisam ser firmes e irreversíveis, o que só será possível com o comprometimento de todos nós com os protocolos e a biossegurança”, ressaltou Marcelo Queiroz. Falta tal comprometimento.

A vacinação caminha em fluxo relativamente contínuo, mas a conta-gotas. Para se ter uma ideia, o atraso no repasse da Coronavac pelo Instituto Butantan, afetou a segunda dose de quase todos os municípios do RN. A governadora Fátima Bezerra, que foi vacinada nesta quarta-feira (19), recebeu seu imunizante  com o tardar de 15 dias.

Mesmo assim, um fator importante é o avanço da vacinação entre os mais idosos. A lotação das UTIs no RN tem sido, em sua maior parte, de jovens e adultos com a forma mais grave da doença. A quantidade de internados em UTIs com menos de 60 anos é quatro vezes maior que no começo do ano e quase triplicou só nos últimos três meses.

Ou seja, os reflexos vistos na TV tem relação com as ações de enfrentamento e o descontrole frente à pressão econômica, tanto de empresários, quanto de setores como escolas, igrejas, entre outros. Os decretos contribuem para que o Estado se destaque no Jornal Nacional da pior forma.