Nylson, a vida, às vezes, é cruel. Você não merecia isso
Você era amor, mesmo com tanto ódio no mundo. Você era a objetificação da vida. Com cor. Traços. Voz
Por Luíza Gurgel, jornalista e atriz
Era aproximadamente umas 18h, quando nos encontramos naquela praça. Era a praça do Rotary. Não me recordo o dia, mas era um em que os nossos compromissos profissionais não atrapalharam o nosso encontro. Foi assim que os nossos abraços vieram a acontecer mais vezes, posteriormente. Sem pretensão, mas cheio de carinho. Poucas pessoas sabiam desses nossos encontros.
Eu, tu, Plínio e nossos cachorros. Lembrando agora, até o celular evitávamos de pegar do bolso, a fim de viver ainda mais o momento. Estávamos vizinhos. Você havia se mudado há alguns meses para uma casa próxima do meu prédio. “Não estou sozinha”, era o que eu pensava. “Finalmente, um amigo por perto”. Nos nossos encontros casuais, ao levar nossos cachorros para passear na pracinha, assuntos não faltavam. (Aliás, nunca faltavam, fossem em quaisquer ocasiões). Projetos, desejos, frustrações, alegrias, desafios, amores, prazeres, tristezas, arte.
De tudo se passava pelas nossas palavras. Sempre foi assim. Desde quando você me viu pela primeira vez com os meus 9, 10 anos, talvez. De certeza, eu ainda era criança. E você me acompanhou crescer. Biologicamente, artisticamente, profissionalmente. Sempre torcendo tanto. Tanto. Verbalizando. Aplaudindo. E eu a ti, meu amigo. Tua felicidade era a minha. E você sabia disso. A vida, às vezes, é cruel. Você não merecia isso. Não merecia mesmo.
Você era sorriso, mesmo quando triste. Você era alegria, mesmo tendo tantas provações. Você era amor, mesmo com tanto ódio no mundo. Você era a objetificação da vida. Com cor. Traços. Voz. Era ela sua verdadeira parceira de “pas de deux”. Era com ela que você bailava. E sempre foi tão lindo te ver dançar. Quem vai ficar nos arrancando sorrisos sinceros antes de começar um espetáculo? Quem vai me dar um abraço apertado na praça do Rotary, enquanto passeamos com nossos cachorros? Quem vai abrilhantar os palcos dessa cidade? Quem?
A gente não está de luto. A gente está de luta. Porque esse era seu verdadeiro sobrenome: luta. A saudade vai ficar grande. Potente. Forte. Igual a tua luz. Um dia, a gente se encontra… com muito amor, da sua grande admiradora.
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P.S. O Blog do Saulo Vale noticiou a morte do artista mossoroense Nylson Torres, aos 37 anos. Ele estava internado há cerca de 20 dias em um hospital de Mossoró, vítima de pneumonia. Nylson atuou durante anos em diversos espetáculos de teatro e de dança, como o Chuva de Bala no País de Mossoró. Ele era dono do Núcleo de Dança Nylson Torres.