Desculpas pelo quê, padre?
Não vamos entrar no cerne do pensamento religioso. Sabe-se que a repercussão foi muito mais cínica do que isso
Por William Robson
Quando o assunto começou a viralizar, foi difícil entender as razões. Conhecido por promover leilões beneficentes no município de Florânia, o padre Gleiber Dantas precisou pedir desculpas por, simplesmente, estar se divertindo. Perdão por consumir bebida alcoólica, fumar e ouvir música (de péssimo gosto, mas escutava). E só. No entanto, foi o suficiente para gerar um escândalo entre as pessoas e alcançar blogs sensacionalistas que, igualmente, se horrorizaram.
A santa hipocrisia começa aí. Até onde se sabe, beber, fumar e ouvir música não é crime. Mas, para estas pessoas, todo mundo pode, menos os padres. Consideram serem divinos, ungidos e que deve se manter longe dos prazeres mundanos. Não devem se envolver com os regozijos da vida terrena e, sim, os do espírito.
Bem, não vamos entrar no cerne do pensamento religioso. Sabe-se que a repercussão foi muito mais cínica do que isso. O padre Gleiber é tão humano quanto os seus críticos. E, como tal, está sujeito às necessidades, aos sentimentos, ao medo, as privações e às necessidades de qualquer ser antropológico. Embora a religião os imponha regras que não coadunam com a essência humana, como exigir o celibato, nenhuma delas a pressionará a ser menos humano. Nem a necessidade de buscar outras realidades.
É aí que a diversão faz o seu papel. A alegria do espírito é interligada a do corpo. Como na letra de “Metal contra as Nuvens”, do Legião Urbana, “o corpo quer, a alma entende”. O ser humano sente a necessidade de viver realidades, não apenas a da vida cotidiana, mas realidades que a extrapolam. E elas podem ser vivenciadas nas artes, na filosofia, na religião e, também, no torpor.
O padre Gleiber vive realidades como todos nós. A da religião é tão complementar quanto a gerada pela alegria que vem do álcool e dos prazeres mundanos. Não há nada de errado nisso. Mas, a hipocrisia exige o cumprimento de regras impraticáveis para o ser humano. Na realidade, as pessoas são moralistas sem moral. Exigem o que não praticam, ou seja, querem esta moral – aos outros.
Para os hipócritas, vale lembrar que nem Jesus foi tão chato. Ele foi convidado para uma festa de casamento, mas a alegria era tamanha que, de repente, acabou o vinho. A mãe de Jesus pediu para que ele resolvesse o problema. “Encontravam-se ali seis jarros de pedra que eram utilizados para as cerimônias de purificação dos judeus e que levavam entre 75 e 115 litros cada”, relata João 2:6. Jesus pediu que enchessem os recipientes de água e quando lançou para que todos provassem, em seguida, tratava-se de vinho. A festa continuou.
“Monsenhor Walfredo e eu, sendo descendentes da Mãe Dondon da Timbaúba dos Batistas, apreciamos um brinde entre amigos, com a Samanaú do nosso querido Dadá Costa. Como mamãe fuma, vez por outra acendo o meu cachimbo; na ocasião, um cigarro, para reportar-me ao nosso amado Monsenhor Walfredo, cuja batina uso a seu exemplo. Cada um de nós tem autocrítica e sabe quando não acerta”, explicou o religioso, que tem todo o direito de se divertir sem remorso e sem pecado enquanto o céu não vem. Tá tudo bem… Saúde, padre!