Saída da Petrobras: por que Mossoró não se preparou para o pós-petróleo?
A Prefeitura de Mossoró era ciente da situação, mas os gestores que passaram por ela, se recusavam a imaginar que a cidade entraria em ciclo descendente em poucos anos. Existiam prognósticos neste sentido
Os mossoroenses são testemunhas do tempo em que a Petrobras atuava fortemente por aqui. Petróleo à vontade, royalties abarrotando os cofres do município e a economia pujante. A cidade vivia o seu melhor momento nos primeiros anos deste século e parecia que estes tempos de felicidade não iriam cessar, porque diziam que as reservas em terra eram amplas.
Lembro que, enquanto diretor de redação do Jornal de Fato, organizei ao lado do jornalista Julierme Torres, uma série especial para a revista Domingo chamada “Dossiê RN”. Neste material dividido em capítulos apontava os avanços econômicos no Estado e em Mossoró, notadamente por conta do petróleo e das políticas progressistas favoráveis naquela época. No entanto, trazia alguns prognósticos e um deles mostrava que o petróleo de Mossoró era, evidentemente, finito. Os tempos de bonança teriam prazo de validade. Era preciso, assim,pensar em uma Mossoró pós-petróleo.
A Prefeitura de Mossoró estava ciente da situação, mas os gestores que passaram por ela, se recusavam a imaginar que a cidade entraria em ciclo descendente em poucos anos. Na época que produzimos a série, no início dos anos 2000, os especialistas previam o colapso do petróleo até 2016. Recordo que foi a manchete do jornal. Eles estavam certos.
A massa salarial desta cidade em pleno desenvolvimento, de repente, caiu de forma dramática. Terceirizadas e subsidiárias da Petrobras demitiram, transferiram seus funcionários em busca de outros lugares para exploração. Os investimentos públicos foram suspensos. A cidade, então próspera, ficou inchada e, com recursos cada vez mais escassos, emergiram as dificuldades de administrar o município. Os grandes eventos, atravessados pelo ideal da “Mossoró do Futuro”, seriam moldados com orçamentos bem mais modestos. Outros deixaram de existir tal qual concebidos: é o caso do Auto da Liberdade.
Não fosse a presença de uma empresa de telemarketing, a situação da cidade poderia estar pior. Mas, sabemos que o setor do petróleo tem níveis salariais bem melhores. Desta forma, não precisa ser economista para saber que o poder de compra do mossoroense minguou. Também minguou a arrecadação da cidade, que não consegue sequer manter os equipamentos inaugurados nos tempos áureos.
Em entrevista ao Foro de Moscow, o sindicalista Pedro Lúcio, disse que a Petrobras já está em fase de desmonte emMossoró, mas que ainda consegue manter parcela ínfima dos empregos. Não se vislumbra cenário de melhora no setor. Pelo contrário. As notícias são de que a Petrobras vai aproveitar a pandemia para “passar a boiada”.
Pedro Lúcio confirmou o que o jornal O Globo destacou em sua edição de 13 de julho. A empresa está vendendo subsidiárias e anunciou nos últimos três meses planos para reduzir em 34% o número de empregados (de 45.500 para 30 mil) no Brasil, além de fechar nove prédios comerciais e deixar metade dos empregados da área administrativa em regime de home office, mesmo após o fim da pandemia.
Alguns políticos potiguares, entre eles o deputado federal Beto Rosado, acreditam que a situação poderia ser amenizada com a venda de campos para empresas menores. Pedro Lúcio alega que a venda não resolveria a questão dos empregos, nem de arrecadação. “As empresas que estão adquirindo estas áreas pagam apenas 1% de royalties. Há uma escala de 1% a 5%. em que a Petrobras pagava sempre o máximo. As empresas privada pagam o mínimo”, explicou Pedro.
E quanto mais entrega as áreas para outras empresas, mais a Petrobras se distancia da cidade. Por meio de comunicado emitido nesta quinta-feira (16), a empresa informa que finalizou a venda da totalidade da sua participação em dois campos de produção terrestres. Ambos são em Ponta do Mel e Redonda, localizados no Município de Areia Branca.
As áreas foram vendidas para a Central Resources do Brasil Produção de Petróleo Ltda por US$ 7,2 milhões, com pagamento a ser realizado ao longo de 18 meses. Pedro Lúcio diz que os poços estão sendo entregues a preço de banana, mas a Petrobras já demonstra que não há mais interesse em explorar a Bacia Potiguar. A estratégia da estatal agora é focar no pré-sal, reduzindo dívidas e áreas que considere menos lucrativas.
Assim, Mossoró chega neste momento como a cigarra da estória com a formiga. No inverno tenebroso, uma cidade perdulária e sem planejamento que não vislumbrava a possibilidade do pior. Mas, o pior foi alertado e veio, deixando os seus rastros.